Educador social de Burela trabalha com famílias e menores em risco de exclusão na localidade de Sigüenza (Guadalajara)
Noemy Cardoso dos Reis Borges
Bruno Faustino nas aulas de alfabetização digital para pessoas adultas |
Bruno Faustino (Burela; 1988) é graduado em Educação Social pela Universidade de Santiago de Compostela. O que tem sido presidente da entidade nacional galega de Altair Galiza (de 2012 a 2017) e coordenador em Burela (entre 2011 e 2018) da sua filial, Chao de Castro, é o responsável de um programa de inclusão da Junta de Comunidades de Castilla la Mancha. Em coordenação com os serviços sociais do município de Sigüenza, atende menores e famílias em situação de exclusão social. Em vista de que uma das suas metas é conseguir um trabalho na nossa terra, continua alargando o seu curriculum com novos títulos como o do Mestrado de Professorado de Educação Secundária ou o Mestrado em Educação e TIC (na Universitat Oberta de Catalunya) que o capacitem para ser professor especializado para gerir e criar espaços de aprendizagem em linha. Com esta entrevista, reforçamos os vínculos entre a Galiza e Cabo Verde.
O nosso interlocutor é migrante entre migrantes. A circulação discorre pelo mesmo itinerário, mas em sentido contrário: da Mancha para a Galiza e da Galiza para a Mancha.
Sou filho de uma família que durante gerações emigrou na procura de novas oportunidades. Por motivos laborais. A minha mãe, Alfonsa Durán, nasceu na Estremadura, mas foi criada em Palencia e Madrid; meu pai, Gaspar Faustino, é nascido em Ciudad Real. Vieram à Marinha para trabalhar na fábrica de "Alúmina Alumínio" (Hoje Alcoa). Antes disso já tinham desenvolvido um longo percurso migratório por Castela, as Astúrias, Andaluzia, Ceuta e as Ilhas Canárias.
O Faustino, que também pode ser nome, neste caso é apelido. Qual é a sua origem?
A origem da saga dos Faustino está em Portugal. O meu bisavô era português, como reflete a certidão de nascimento do meu avô, Ceferino Faustino, no apartado de dados referentes a seu pai. Segundo as minhas últimas pesquisas apoiadas no Árquivo da Universidade de Coimbra, o meu “devanceiro” Gaspar Faustino Grangeia nasce no lugar da Camarneira, freguesia de Covões no concelho Cantanhede (no distrito de Coimbra). Na procura das origens do meu apelido patronímico descobri que levamos o apelido de uma mulher, a Rosa Faustino, que teve um filho de solteira, o meu trisavô António Faustino. Além disto, devido à emigração secular da família, venho de descobrir recentemente que a genealogia dos Faustino, além de na Espanha e na Galiza, está estendida e presente por outros países como Portugal e o Brasil. Pendente tenho de localizar algum parente que provavelmente viva no distrito de Coimbra (Portugal) ou São Paulo (Brasil). O resto, os não portugueses, são da Estremadura e de Ciudad Real. Embora as minhas raízes sejam na metade estremenhas, um quarto portuguesas e outro quarto manchegas, eu sinto-me identitária, cultural e integralmente galego e filho desta cultura milenária.
Toda a base da sua educação formal foi realizada na Marinha?
Fiz a educação infantil no “parvulário” de Burela. Foram anos felizes! Após os seis cursos de Ensino Primário noutra das escolas da localidade, cursei o Ensino Secundário Obrigatório nos IES Perdouro e Monte Castelo. Os da adolescência foram para mim anos turbulentos e uma rebeldia auto afirmativa e sem causa levou-me a perder dois cursos. Procurei outra via para obter o título de ESO através do Ensino Secundário para Pessoas Adultas, com bons resultados, e retornei ao IES Perdouro para realizar o Bacharelato de Humanidades, perante o assombro de alguns docentes que não acreditavam muito em mim. Superada a Prova de Acesso à Universidade, ingressei na Diplomatura de Educação Social. Quando terminei a diplomatura, a seguir, valorei continuar os estudos cursando o Grau em Mestre de Educação Infantil mas, finalmente, decidi fazer um curso de adaptação ao Grau na mesma especialidade (a da Educação Social).
Da etapa de estudante em Compostela é a entrada no voluntariado através de Altair.
No ano 2011 conheci o professor Elias Feijó e participei na fundação de um movimento internacional de voluntariado em educação nos tempos livres denominado Altair. Essa aventura levou-me à Ilha de São Vicente (Cabo Verde) e na cidade do Mindelo colaborei com jovens interessados em formar um agrupamento educativo Altair. Assim nasceram Monte Cara-Altair (em Cabo Verde), hoje Estrelas Altair, e Chao de Castro-Altair (em Burela), agrupamento hoje inativo, e, depois em Santiago, Seteportas Altair. Também participei na fundação da Escola de Educação nos Tempos Livres Altair destinada a lecionar cursos de monitorado e direção nos tempos livres.
O que faz agora Altair?
Uma vez consolidado o agrupamento de Santiago, estamos imersos na criação dum novo agrupamento na Corunha, o Farobrigantium Altair. O meu grande sonho é a reativação do agrupamento de Burela ou a fundação dum novo para a Marinha -por isso estamos na procura de voluntari@s- e proximamente lançaremos um curso de monitorado para pessoas que queiram fazer parte da associação. É da minha gente da Altair de quem eu tenho aprendido algumas das coisas mais importantes para a vida.
É uma etapa de combinação da formação teórica com o exercício prático no dia a dia e nos acampamentos.
Desde o ano 2011, sem contarmos os de Seteportas, organizamos em Chao de Castro-Altair mais de 25 acampamentos com crianças de entre 8 e 18 anos. Tive a imensa sorte de estar em todos e inclusive nalgum de Seteportas-Altair como o de este verão em Portocelo (Xove). Além disso, na escola foram 8 edições do curso de monitoria e mesmo uma do de direções. Participei como docente, responsável de práticas do alunado e cumprindo funções de gestão desde a secretaria da escola. E nisso, desde a distância, continuamos atualmente!
Com esta formação académica recebida na USC e complementar em Altair, não terá sido difícil a entrada no mundo laboral.
Não foi um percurso bucólico. Para além de trabalhos pontuais e díspares como o de colocar pão de forma nas embalagens ou ajudante de montagem em gravações de vídeos musicais ou jardineiro, tive alguns trabalhos mais relacionados com a minha formação, dentro do âmbito dos serviços à comunidade. Fui professor de reforço e técnicas de estudo, monitor do programa Sempre en Activo da Deputación de Lugo para a alfabetização digital e o envelhecimento ativo de pessoas maiores e monitor de noite e de fim de semana na Asociación de Axuda ao Enfermo Mental "A Mariña”. No ano 2018 fiquei no desemprego.
Como consequência do desemprego, pensou na possibilidade de emigrar, neste caso a um lugar em que estão parte das suas raízes.
Uma vez que se aposentaram, em 2012 meus pais retornaram a Guadalajara (onde está instalada hoje a maior parte da família) e ofereceram-nos provar sorte ali. Desta forma, reproduzindo a nossa história migratória, decidimos migrar. Em julho desse ano 2018, um mês depois de chegarmos, chamaram-me para trabalhar na ONG Accem como Educador Social; desde esse momento trabalho para essa entidade. Participei em PAHI, um programa de ajuda humanitária a pessoas que chegam à península de forma irregular -em embarcações ou cruzando a fronteira de Ceuta e Melilha-; posteriormente fui técnico de SAT, o serviço de acolhimento temporário que trabalha com emigrantes solicitantes de proteção internacional -aqueles que são fugidos do seu país porque a sua vida corre perigo por motivos políticos, religiosos, étnicos ou de orientação sexual-; trabalhei num Centro de Menores com jovens não acompanhados (MENA’S); e participei na criação de um centro juvenil em Brihuega. Desde o ano 2020 sou o responsável de um programa de inclusão da Junta de Comunidades de Castilla la Mancha que gere a entidade na localidade de Sigüenza. Em coordenação com os serviços sociais do município, trabalho com menores e famílias em situação de exclusão social.
O retorno à Galiza está num horizonte mais ou menos próximo?
A meio prazo, o meu objetivo é continuar com a formação e preparar oposições para professor do Ensino Secundário. Isto está dentro de uma estratégia que eu denomino "o caminho de regresso". Quero retornar à Galiza, que é de onde eu sou e onde quero viver, interpretando em positivo o "aqui nasci e morrerei" que dizia o Sacristão de Basão, tema dos Rastreros que popularizou o Xabarín na minha infância. No ano 2023 apresentar-me-ei às provas e aguardo alcançar a meta: superar o destino migratório assentado historicamente na minha família.