07/03/22

MIGUEL ARCE, PROFESSOR NO IES BERGIDUM FLAVIUM DE CACABELOS: “Levo dez anos a ensinar o nosso idioma em centros educativos bercianos”

                                                                                                                 
                                                                                                                 Noemy Cardoso dos Reis Borges
 Nascido em Santiago de Compostela (1977), Miguel Arce estudou a Licenciatura em Filologia Galega e a seguir a de Filologia Portuguesa; e frequentou também três Mestrados: um na Universidade de Santiago, outro na Universidade Nova de Lisboa e o de Professorado de Ensino Secundário no Campus de Lugo da USC.

Após ministrar aulas (desde 2002) nas formações de adultos de língua galega organizadas pela Junta da Galiza, trabalhou brevemente na dinamização linguística municipal e agora é docente de Língua e Literatura e também de Ciências Sociais no IES Bergidum Flavium de Cacabelos.

 

 

Como é habitual nesta série de colaborações, queremos começar a entrevista com uma contextualização social da pessoa entrevistada. Onde estão as tuas origens e qual é o perfil linguístico da tua infância e da adolescência?

 

A família de meu pai era da Matança (em Íria Flávia) e a da mãe de Lestrove. Por uma parte e pela outra eram galego-falantes. Como já era habitual naquela altura, devido à pressão social da cidade à que emigraram (Santiago), ambos fizeram tentativa de manter o relacionamento com os filhos em castelhano. Contudo, no final da adolescência -estando no Instituto Rosalia de Castro- mudei para a língua galega.

 

Quando experimentaste as variações entre os sotaques da Galiza e de Portugal… e quando conheceste a norma escrita internacional? 

 

Inicialmente, conheci a variação entre os sotaques nas viagens a Portugal (ao Norte e ao Centro do país) e fiz as primeiras leituras. Mais tarde estudei Filologia Portuguesa e, para além disso, intensifiquei as viagens ao Sul. Já na vida adulta, trabalhei e morei durante 4 anos em Portugal.

 

 Após o primeiro Mestrado em Filologia Galega, fizeste um segundo, neste caso o de Estudos Portugueses na Universidade Nova de Lisboa. Como foi a experiência?

 

Os Estudos Portugueses estavam dentro dum Mestrado da Universidade Nova. Eu escolhi as disciplinas de literatura. Gostei muito de conhecer o romanceiro tradicional, a poesia portuguesa das vanguardas e contemporânea, mas fiquei desiludido com as literaturas africanas, pois em vez de trabalhar com os autores atuais, só explicaram a literatura dos Descobrimentos. Para além dos Estudos Portugueses, aproveitei a ocasião para estudar catalão no Instituto de Línguas daquela mesma universidade.

 

Uma experiência bem diferente foi a de formar pessoas adultas…

 

Foi uma experiência muito positiva. Ajudas a romper preconceitos, melhoras a sua competência escrita e oral em galego, e ajuda-los a progredir profissionalmente ou a integrar-se na sociedade galega quando é o caso de imigrantes. Gostei também de  introduzir elementos da cultura e da literatura galega nas aulas. Tentávamos oferecer a chave para entrar num mundo novo.

 

 Quando trabalhaste em equipas de dinamização municipais?

Foi durante um período curto. Trabalhei só três meses no Serviço de Normalização Linguística de Foz no ano 2012. Ainda está na rede o blogue intitulado Foz Língua Viva, que recolhia uma análise sobre a presença do nosso idioma na vila e no conjunto das paróquias daquele concelho da Marinha.

 

Desde dez anos atrás es professor no Berço. Por que centros passaste?

Dou aulas no Berço desde setembro de 2012, e já lecionei nos liceus Virgen de la Encina de Ponferrada, no IES Bergidum Flavium de Cacabelos e na Escola Oficial de Idiomas de Ponferrada, onde lecionei galego e num breve período também português.


Qual é a oferta educativa que se ministra no nosso idioma nestes centros educativos? Só língua ou língua e literatura? 

 

De 1º a 4º da ESO, estudam a disciplina de Geografia e História em Língua galega. E em 4º de ESO e 1º e 2º de Bacharelato leciona-se uma disciplina de Língua e Cultura Galega, com conteúdos linguísticos, culturais e literários.

 

Em que curso começam e qual é a dedicação horária semanal?

 

Começam já na etapa do Ensino Primário com a disciplina de Plástica ministrada em galego. Em 4º a matéria de língua tem duas horas, em 1º Bacharelato três e em 2º quatro horas semanais.

 

Qual é o perfil do alunado?

 

São estudantes bercianos de famílias galego-falantes, estudantes com parte da família na Galiza e estudantes bercianos sem contato com o galego mas que veem na aprendizagem do galego uma saída profissional para trabalharem na Galiza.

 

Como é o  balanço a respeito destes 10 anos de ensino na comarca berciana? 

 

É uma sensação agridoce: por um lado escutar o galego falado no exterior e por outro ver que, por causa de ter-se perdido a transmissão intergeracional, a situação da nossa língua no Berço é crítica. Contudo, embora se trabalhe numa situação de permanente precariedade, é muito positivo contribuir a manter aberta esta porta de progresso educativo.



Ligações

https://fozlinguaviva.wordpress.com/

https://www.youtube.com/watch?v=yB_32tbLr2U&t=26s


HERMAN ALVES: “PROCURAMOS MÚSICAS ORIGINAIS QUE CONSIGAM ABRAÇAR O MUNDO”


Flávio Varela Rocha


O seu nome é Herman Alves. Mora em Montreal, no Quebec. Está no meio do caminho entre os 60 e os 70 anos. Dirige a Hermedia Publisinhg, produtora musical que acaba de editar uma homenagem à Amália Rodrigues, em comemoração do centenário do seu nascimento, e imediatamente depois um novo disco do Zé Perdigão (conhecido entre nós pela interpretação do “Sou galego até ao Mondego”).

Nascido em Porto de Mós, no distrito de Leiria, Herman Alves (1957) deixou Portugal para emigrar primeiro à Alemanha e depois ao Quebec, ainda durante a adolescência. Na América do Norte entrou no mundo dos negócios nos ramos da hotelaria, a informação tecnológica, as telecomunicações, o lazer e o turismo. Nestes dias passados esteve convidado no Grandes Vozes, o programa do Marco Pereira Oliveira, para falar da sua participação na indústria musical.


Do centro de Portugal para a Alemanha e depois para o Quebec


No momento de se apresentar, o entrevistado situa-nos geograficamente na Serra dos Candeeiros, perto da praia de Nazaré, a só vinte minutos do mar e a outros tantos de Fátima; perto das grutas de Mira D’Aire e do Mosteiro da Batalha, “onde houve a grande guerra entre castelhanos e portugueses em 1494”. Segundo as suas próprias palavras, a infância de Herman Alves foi difícil: “Donde eu venho só havia pedras. Pedras para brincar, pedras para construir… mesmo a agricultura era feita entre as pedras, porque tínhamos pouco terreno cultivável. No meu primeiro livro, que se intitula Breaking Stone, recolho essa história de que com dez anos comecei a trabalhar partindo pedras para a construção de uma estrada”.

Mas não só foi difícil o período da infância. Quando o rapaz contava com 12 anos, a família  emigrou para a Alemanha e esteve na cidade de Hamburgo por um período de um ano. Posteriormente, tomaram rumo ao Quebec para começar de novo: “Chegamos a Montreal em 1969 e naquela cidade recebi a educação. Com os atrasos na escola -pelos anos perdidos, anteriormente em Portugal e Alemanha e por não ter conhecimento nem do francês, nem do inglês, e sem muitos apoios por parte da família- deixei os estudos aos 15 anos. Os filhos de migrantes necessitamos um apoio que não temos: as nossas famílias agarram-se ao trabalho e pensam que os filhos têm o apoio necessário na escola, mas não é assim. É por isso que há muitos jovens que largam. No meu caso, só mais tarde -sendo adulto- consegui entrar para a universidade”.



Paixão pela música


A paixão pela música fez com que aos 16 anos Herman Alves liderasse a criação de um grupo musical, o “25 de Abril”, mas a iniciativa não chegou a alcançar o estrelato: “compreendi que tinha imaginação, mas carecia de talento suficiente para a interpretação musical”, enfatiza Alves. Contudo, aos 26 anos vinculou-se à música de jeito diferente: tornou-se empresário. Primeiro comprou um clube,  passou a organizar espetáculos numa sala com capacidade para 400 pessoas e depois participou na criação de dois encontros musicais conhecidos no mundo todo: The Montreal International Reggae Festival em 1988 e o Festival Des Rythmes du Monde em 2004.


Após deixar por um tempo a organização de eventos, em 2012 retornou à música através do filho maior. Juntos abriram vários locais em que estão em convívio as exposições de artes plásticas, a oferta gastronômica e a música ao vivo.


Atualmente dirige a Hermedia Publishing, a empresa de produção musical que organizou a antes citada homenagem à Amália Rodrigues pelo centenário do seu nascimento: “Comecei a comunicação com artistas de vários países. Queríamos que o mundo cantasse para a Amália canções originais e estiveram disponíveis David Garcia(USA), Mandie Vieira (Austrália), Zé Perdigão (Cabo Verde), Kelly Rosa (Brasil), Karina Beorlegui (Argentina), Cordeone (França), Sónia Shirsat (Índia), Marta Raposo (Canadá), Mayya Rud (Ucrânia), Vânia Dilac (Portugal/Açores) e Magma Gospel (Portugal/Açores)”.

 Finalizados os trabalhos desse disco de grande sucesso, também com a colaboração do Zé Perdigão, o empresário luso-canadiano começou uma nova aventura, neste caso a produção do novo disco do artista de Guimarães assentado em Cabo Verde. O Abraços é uma homenagem às diásporas dos países lusófonos e entre as diferentes canções que contém está a intitulada “A Costureirinha”, escrita em colaboração por cantor e produtor e “inspirada na vida da minha própria mãe”, segundo proclama Herman Alves com orgulho.